Por Jânsen Leiros Jr.
“É uma atitude presunçosa comentar sobre o livro de Jó. Ele está repleto da realidade temível do Deus Vivo. Como Jó, somente se pode por a mão na boca (40:4). Deus, porém, Se revelou conservando, ao mesmo tempo, o mistério inacessível da Sua própria existência. Devemos, portanto, tentar esta coisa impossível que Ele toma possível (Mc 10:27). Por mais medo que Ele cause, Ele nos fascina irresistivelmente até que, mediante “a bondade e a severidade” (Rm 11:32), nos leva à própria maneira, à satis[1]fação e alegria finais de Jó. A história de Jó é um convite e um guia para descobertas como a dele. É especialmente o livro para quaisquer pessoas que se acham “no dia da doença de Jó” como resultado dalguma experiência abaladora.”
JÓ – Introdução e Comentário
De Francis I. Andersen
Pág. 8; prefácio do autor
Sempre que somos colocados diante de questões complexas, temos a tendência de, ou minimizar tal complexidade desconcertante, ou eleva-la a um grau de exigibilidade e pertinência, que eventualmente está muito além de nossas parcas capacidades para desvendar. Relativamente ao livro de Jó não é diferente. Muito pelo contrário!
Se a tarefa teológica de comentar livros bíblicos já é por si só desafiadora, já que falamos de textos antigos, contextos remotos, e de culturas passadas com pouco ou nenhum registro histórico-científico confiável, imagine quando tal tarefa se concentra em um livro em que as poucas fontes se tornam ainda mais escassas, ou não existem na prática. Esta é a realidade de quem se pretende a desafiar Jó.
Diante de tal circunstância, penso que o professor Francis, de quem emprestamos o texto acima, tem toda a razão ao afirmar ser uma atitude presunçosa partir para um estudo deste livro. Mas considerando que tal presunção não o impediu de enveredar-se por este caminho – e ele mesmo tornou-se uma das boas referências sobre o assunto, devo acreditar que o desafio se lhe tornou prazeroso em bem pouco tempo ao partir em sua jornada, pois o que vemos em seu comentário é um estudioso encantado com suas descobertas, muito mais do que academicamente ocupado em extrair obviedades do texto. Seria esta a parte do temor e fascínio que ele mesmo afirma sentir? Talvez, mas penso que daqui, da porta, não será possível respondermos esta questão. Então é melhor entrarmos. Você é meu convidado.
Quando propus aos meus alunos o tema Jó entre outros livros do Antigo Testamento, houve plena unanimidade em sua escolha como tema para o novo período de estudos. Penso que eles não imaginavam no que estavam se metendo. Mas confesso que eu também não. Porque, sem querer dar spoiler sobre as questões que já já debateremos, posso adiantar que poucas vezes em minha razoavelmente adiantada experiência cristã, estive tão confrontado em meus instintos religiosos mais básicos, primitivos e equivocados. Andei sobre a linha tênue que divide uma legitima vida piedosa, do ufanismo religioso hipócrita, muito comum e de grande oferta em nossos dias.
Assim, lembrando que todos os nossos registros aqui constituem uma obra aberta, posto que sustentada em convicções transitórias sempre em busca de melhores percepções, convido você a inaugurar uma jornada inquietante por este livro tão desafiador, revelador, e sobretudo transformador. Aliás, esta foi a sensação principal do próprio Jó ao sair do outro lado do túnel que atravessou; “antes… mas agora”. Porque, no final das contas, texto que apenas informa e não transforma, embrulha o peixe.
Jânsen Leiros Jr.
Radialista, escritor e articulista da Rádio Bicuda FM