Por Jânsen Leiros Jr.
“Não havendo sábia direção, toda a nação é arruinada; o que a pode restaurar é o conselho de muitos sábios.”
Provérbios 11:14 – KJA
“O caminho do insensato é reto aos seus olhos; mas o que dá ouvidos ao conselho é sábio.”
Provérbios 12:15 – JFA
“A arrogância só produz contendas, mas a sabedoria está com aqueles que buscam conselho.”
Provérbios 13:10 – KJA
“Onde não há conselho, frustram-se os projetos; mas com a multidão de conselheiros se estabelecem.”
Provérbios 15:22 – JFA
“quem parte para a guerra necessita de orientação estratégica, pois com muitos conselhos se conquista a vitória!”
Provérbios 24:6 – KJA
“Mais vale um jovem pobre e sábio do que um rei ancião e insensato, que em sua arrogância já não aceita mais conselhos.”
Eclesiastes 4:13 – KJA
“Se conselho fosse bom ninguém dava; vendia.” É o que diz a sabedoria popular. E interessante, esse ditado é argumento tanto para quem quer aconselhar, mas teme a reação de seu interlocutor, quanto para quem efetivamente não quer aceitar qualquer conselho sobre um determinado assunto, principalmente se esse conselho sugere não realizar alguma coisa da qual se está muito interessado em fazer. Normalmente ouvimos de bom grado os conselhos que nos atendem as próprias inclinações. Servem sempre e convenientemente para justificar atitudes, ou para criar o “bode expiatório” a quem culparemos pelo que quer que dê errado. – Tá vendo?! Fui ouvir você… Olha no que deu!
Nesse cenário por onde caminha a realidade da conduta humana e suas conveniências, parece até desaconselhável, emitir conselhos sobre qualquer que seja o assunto, em quaisquer que sejam as circunstâncias, sob pena de ser inoportuno diante da inflexibilidade do aconselhado, ou de ser responsabilizado pela desventura daquele a quem se pretendeu ajudar. Dura é a vida do conselheiro. Bem faz o consultor que cobra pelo conselho que dá. Afinal, conselho bom se vende.
Mas nosso foco aqui não será o conselheiro e nem mesmo o conselho em si, mas a atitude sábia de se aconselhar, de se enriquecer com o máximo de informações e percepções sobre um determinado assunto, antes de tomar uma decisão, ou firmar posição. Na multidão dos conselhos habita a sabedoria. Mas qual é a conexão entre tomar conselho, e o exercício filosófico a que se pretende a mania de pensar no que cremos? Eu diria que total.
Uma das características mais marcantes da filosofia é o seu método. No trabalho incessante de buscar respostas para suas questões, chegar a alguma resposta é menos importante que o próprio processo de se buscá-las. O exercício da investigação, é de fato, a chama inextinguível do pulsar filosófico. E isso se dá em grande medida, não se sabendo bem o que é causa e o que é efeito, porque a filosofia não trabalha com verdades absolutas, ensimesmadas que são de particulares observações do mundo à volta do filósofo, ainda que suas afirmações, oriundas de diferentes e variadas contribuições de seu cotidiano, sempre se pretendam à universalidade.
Desse modo, não havendo por princípio uma verdade absoluta a que alguém possa chegar por particular observação, a investigação de certas questões sempre estará a mercê de sucessivos exercícios elucubrativos, que alternarão os assuntos em seus laboratórios, conforme circunstâncias históricas e sociais, que demandem posicionamento ou orientação do pensamento humano e de senso comum.
Esse perfil da atividade filosófica, é milenar. Nas escolas filosóficas da antiguidade, os alunos eram sempre estimulados por seus mestres a buscarem entendimentos divergentes de suas observações. Em vez de lhes ensinar apenas a conclusão a que chegavam, instruía-os no caminho que trilhavam até uma determinada ideia, incentivando-os a autonomia de pensamento. Assim, eram estimulados a discordarem e a criticarem seus mestres, trazendo novas concepções e possibilidades de entendimento das questões sobre as quais se debruçavam.
Ora, no mundo das ideias o tempo cronológico não limita e muito menos impede o debate entre os diversos pensadores da história universal. Ora contradizendo, ora corroborando, pensadores se sucedem na tarefa de trazer às suas ágoras contemporâneas, questões que serão discutidas livremente por diversos filósofos, quer estejam presentes fisicamente, quer se façam presentes por intermédio de suas obras, registros, ou tradição oral a eles atribuídas. Uma verdadeira academia do pensamento, onde o mundo pode se aconselhar com as ideias e contribuições deixadas por cada um dos seus realizadores históricos.
Esses conselhos a que me refiro, são contrapostos, criticados, discutidos e comentados. Quer aceitos na íntegra ou em partes, quer rejeitados por completo, todos inexoravelmente servirão de parâmetros que orientarão o pensamento humano através da história, em suas demandas por conhecimento e direcionamento existencial. A cada fase da nossa história, novos integrantes vão compondo essa academia do pensamento, enriquecendo todo e qualquer debate, e contribuindo para visões cada vez mais adequadas à contemporaneidade do debate mais recente. Na multidão dos conselhos habita a sabedoria. Não é erro de digitação. Estou repetindo essa frase propositalmente.
Não obstante a costumeira demonização da atividade pensante no que se refere a investigação das razões de nossa fé, penso mesmo que na multidão dos conselhos habita a sabedoria. Ou seja, quanto mais rodeado de conselhos, quanto mais enriquecido pela atividade do pensamento humano, quer para confirmá-lo, quer para rejeitá-lo, tanto mais consistente serão minhas posições, uma vez que frutos de uma conclusão robusta, não oriunda de uma mímica conveniente e oportunista qualquer, mas nascida de uma atividade responsável e prazerosa; a renovação do nosso entendimento, para compreendermos a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.[1]
A essa altura muitos já devem ter torcido o nariz. Mas haverá também quem rasgue as próprias vestes[2]. Porque o questionamento bem como a confrontação de ideias e visões de mundo, são, em tese, os melhores e mais bem-sucedidos métodos de aprofundamento do conhecimento, qualquer que seja a disciplina ou ciência na qual se esteja inserido. Inclusive na teologia. Ou não foi assim que avançou a revelação de Deus ao longo da história da humanidade, mais particularmente na história de Israel?
O questionamento das tradições judaicas, bem como a confrontação dos costumes religiosos dos escribas e fariseus, estão espalhados por todo o relato dos evangelhos. As ideias convenientemente estabelecidas sobre o que era religiosidade, davam à elite religiosa uma confortável condição de destaque, concedendo prestígios e acumulando-lhes vantagens oportunas. Mas Jesus lhes questionava a pertinência dos hábitos e a natureza das intenções. Ele confrontava repetidamente a superficialidade de seus ritos, como a realidade maldosa de suas pretensões. Não foi sem motivo que esses profissionais da religião e aproveitadores da boa fé do povo, foram chamados, sem hesitação, de hipócritas e de sepulcros caiados, dado o fingimento com que se apresentavam como piedosos e probos religiosos.
Paulo não agiu muito diferente. Toda sua teologia, em visível construção ao longo de suas cartas, é fruto do questionamento e da confrontação. Tal embate dava-se entre tudo o que até então se acreditava, e aquilo que se descortinava diante de seus olhos, à medida que sua experiência da vida transformada lhe propiciava novas percepções sobre a relação da humanidade com Deus. Confrontando ideias e questionando a si mesmo, aquele zeloso judeu que consentiu com a morte de Estevão e empreendeu viagem para prender e julgar os seguidores de Jesus, tornou-se o principal expoente do cristianismo, sendo o principal evangelizador entre os gentios.
Ora, é preciso sair do casulo. Abrir os olhos. Tomar conselho com a vida e suas possibilidades. Rasgar as receitas de existências pré-moldadas, e se lançar às experiências enriquecedoras que a relação com Deus e com as pessoas que nos cercam são capazes de produzir. Precisamos correr o risco do inédito em nosso cotidiano. Prestar um culto racional pela transformação da nossa mente. É na mente que são produzidas as ideias. É na mente que se armazena o entendimento. Se não cremos porque entendemos, é por entendermos que sustentamos e enriquecemos nossa relação com Deus, e somos renovados em nossas inclinações e conduta.
“Um homem sábio é poderoso, e quem possui entendimento potencializa sua força;”
Provérbios 24:5 – KJA
Portanto reitero o convite. Leia, ouça, assista, debata, pergunte e questione. Leia incessantemente sua Bíblia e abra espaço para outras literaturas. Ouça louvores e adore a Deus com inteireza de coração, mas não deixe de ouvir poesia e cantar a vida em verso e em prosa. Assista na TV seus programas prediletos e não perca a oportunidade de analisá-los e comentá-los; a ficção ajuda a debater o mundo real. Do que entende e conhece, ensine; o que não sabe, pergunte. O que não compreende questione. Mente vazia, dizia minha avó, é oficina do diabo. Afinal de contas, é na multidão dos conselhos que habita a sabedoria.
[1] Romanos 12:1-2
[2] Mateus 26:65; Joel 2:13
Jânsen Leiros Jr.
Radialista, escritor e articulista Bicuda FM